Em menos de dois meses, se tudo der certo, a goiana Rio Verde será a primeira cidade brasileira a concluir a migração para o sistema digital de televisão, desligando as transmissões analógicas. Mas há sérias pistas de que não dará. E essa realização elevou muito a ansiedade do grupo de emissoras de tevê, teles e governo que pilota o processo de transição. Ninguém sabe o que fazer.
O braço operacional do desligamento analógico, a EAD, empresa formada pelas teles que ficarão com a radiofrequência desocupada, sugeriu repetir-se aqui medidas adotadas na Europa, como fazer a tarja sobre a imagem que avisa a mudança ocupar a maior parte da tela. E diante daquelas pistas preocupantes, foi além: quer que toda a programação seja em preto e branco e sem som. Ou mesmo desligada durante o horário nobre e aos domingos.
A reação das emissoras de tevê foi a esperada. “Uma semana depois de receber a proposta, ainda estou em choque”, respondeu um dos representantes da radiodifusão no Gired, o grupo de TVs, teles e governo. A contraproposta foi aumentar a frequência da campanha informativa que já vai ao ar em Rio Verde (e em Brasília, com desligamento em abril de 2016). Mas a campanha não parece ser suficiente para motivar os telespectadores.
As medidas desesperadas se escoram em dados desanimadores colhidos entre os rio-verdenses. De cada 100 lares, 10 afirmam que só vão atrás de um novo televisor ou solução digital depois do desligamento. Já derruba a meta mínima de 93% dos domicílios preparados. Mas piora. Outros 15 disseram não ter a menor ideia de quando vão tomar uma providência. E ainda outros 15 garantem não ter nenhuma intenção de fazê-lo. Nem antes, nem depois.
ABC e RTV
Não surpreende, assim, que a EAD defenda a terapia de choque. Mas a proposta envolve uma segunda preocupação das emissoras, pois sustenta que as intervenções durante a programação também atinjam as retransmissoras. E aqui cabe um parênteses sobre a escolha de Rio Verde: a cidade foi escolhida como projeto-piloto da transição digital, mas conta com apenas uma geradora local, da Globo. As demais são apenas retransmissoras.
Para começar, isso significa que apenas os espectadores da Globo na cidade são ocasionalmente bombardeados pelas propagandas que avisam do desligamento analógico, definido pelo cronograma para 29 de novembro próximo. Por outro lado, ao levar campanha, tarjas e demais intervenções sobre a transmissão para as retransmissoras, estaria criado um precedente para futuras exigências das RTVs. E isso as emissoras de televisão querem evitar.
Nesse contexto, as teles, que pagaram R$ 9 bilhões pelas outorgas e pela ‘limpeza’ da faixa de 700 MHz, temem virar um novo ‘extintor ABC’, que teve sua obrigatoriedade adiada até ser simplesmente cancelada. Para os radiodifusores, o calendário já está inviabilizado. E os representantes do governo e da Anatel no Gired querem passar o abacaxi para o andar de cima, deixando para o ministro das Comunicações (seja ele quem for), a decisão sobre o que fazer.
Fonte: FNDC